Documento
Íntegra do discurso de transição de cargo do ex-prefeito Rossano Gonçalves
"Uma pessoa com uma crença, é um poder social maior que noventa e nove pessoas que possuam apenas interesses".
John Stuart Mill (1861).
Senhoras e Senhores,
Meu prezado Prefeito Lucas,
Meus secretários e colaboradores,
Minha querida esposa Adriana,
Querido ex-prefeito Glei Menezes,
Prezada Larissa,
Meu bom dia a todos.
Todos nós em algum momento vamos enfrentar situações e contextos em que é preciso coragem para romper barreiras e embaraços para cumprir um propósito maior. A prudência, que costuma ser apenas um apelido para o comodismo, procura o conforto da segurança daquilo que já se tem como certo. Entretanto, há ocasiões em que, para cumprirmos o dom e a vocação que Deus nos concedeu, precisamos estar dispostos a abrir mão do que já se conquistou para enfrentar novos desafios.
Em toda minha história de vida, nenhuma das grandes vitórias que a generosidade do povo gabrielense me concedeu foram conquistadas dando ouvidos ao conformismo. Quando minha família enfrentava a dor da perda do meu irmão Renato, no auge do seu vigor político, quando muitos aconselhavam a não ingressar na arena política, o povo da minha terra confiou em mim para o cargo de vereador, minha primeira função pública, onde tive a chance de me tornar constituinte da nova Lei Orgânica.
Quando todas as vozes mais experientes me aconselhavam a buscar uma reeleição tida como certa para a Câmara de Vereadores, aceitei o desafio de enfrentar minha primeira batalha ao Executivo como candidato a vice de Erasmo Chiapetta. Não vencemos aquela eleição, mas travamos o bom combate com uma certeza: São Gabriel precisava de um prefeito que olhasse para todo o povo, para toda sua gente, e não somente para os mais privilegiados.
Quatro anos depois, quando todas as pesquisas davam como favorito o candidato do prefeito da época, iniciamos uma caminhada palmo a palmo, pé no chão, um grupo pequeno de companheiros percorrendo os bairros conosco, na campanha que foi apelidada de "candidatura do sapato furado". Furamos sola de sapato dialogando com a nossa gente, conquistamos adesões, e naquele 15 de novembro de 1997, aos 33 anos, São Gabriel me dava a honra de ser o prefeito mais jovem de toda sua história.
Identificamos e consolidamos o volume da dívida pública, realizamos investimentos de microdrenagem, construção e reforma de moradias populares, e formalizamos o primeiro convênio da Prefeitura com a Santa Casa de Caridade, para que o povo gabrielense não tivesse mais que pagar pelo atendimento em urgência e emergência. Hoje poucos se lembram como era, e de lá para cá os investimentos para que a nossa Santa Casa se tornasse uma referência em saúde pública só cresceram.
Em mais uma marca histórica, o povo de São Gabriel fez de mim o primeiro prefeito reeleito de sua história, e passamos a investir na ampliação da rede de saúde, que quando assumi tinha apenas três postos de saúde e duas antigas Caravans, adaptada como ambulância. Hoje nossa rede de saúde básica tem grandes unidades nos bairros e no interior, atendimento SAMU e uma frota de transporte para outros centros de referência, além de uma variedade de serviços como fisioterapia, práticas integrativas, e custeio de exames que deveriam ser bancados pelo Governo do Estado, como tomografias, ressonâncias, cirurgias e muitos outros. Foi nessa época que enfrentamos a luta pelo reconhecimento do direito à propriedade contra os arreganhos autoritários de um governo federal que apoiava o terrorismo no campo - esse sim, um governo verdadeiramente fascista, antidemocrático, criminoso e corrupto que saqueou a nação brasileira. Lembro, com saudosa memória, dos conselhos e da companhia gentil do grande prefeito que aceitou generosamente ser meu vice, doutor Eglon Meyer Corrêa. Nessa época, investimos R$ 20 milhões em valores de hoje para recuperar a antiga Cooperativa Rural Gabrielense, para estabelecer o Frigorífico CORIVA, hoje Marfrig, que gera empregos indispensáveis pra nossa gente, que não existiriam se não fosse esse importante investimento do Município.
Passado esse período, já fora da Prefeitura, recebi muitos conselhos para não me candidatar à Assembleia Legislativa, coisa que consideravam uma aventura eleitoral perigosa. Fui eleito deputado estadual e tive a oportunidade de fazer um duro combate no Parlamento gaúcho pelos municípios, contra as corporações de altos salários do serviço público estadual, a favor da modernização administrativa do nosso Rio Grande.
Um tempo depois, os mesmos que me aconselharam a não disputar o cargo de deputado estadual se impressionaram quando eu renunciei ao mandato parlamentar para novamente disputar a Prefeitura. Muitos certamente expressavam suas dúvidas de forma sincera, mas outros tantos talvez não tenham entendido meu amor e meu compromisso com minha terra, e que julgavam que em algum momento da minha história eu teria receio de tomar uma decisão cedendo ao comodismo do cálculo político. Foi mais um tempo de desafios, quando tornamos São Gabriel um dos primeiros municípios do Brasil a pagar, na íntegra, o Piso Nacional do Magistério, e quando começamos grandes investimentos em uniforme, material escolar de qualidade e gratuito pra nossos estudantes. Se hoje as gestões modernas no mundo todo se preocupam com a Sustentabilidade e o Meio Ambiente, naquele período enfrentamos uma grande luta e enorme incompreensão para implantar nosso Plano Municipal de Saneamento, com concessão à iniciativa privada, investimentos em obras, tarifa mais barata, e acima de tudo, o início da revitalização do nosso manancial de águas, o Rio Vacacaí. Contra todas as expectativas da época, em pleno governo do alinhamento das estrelas, construímos os apartamentos do Minha Casa Minha Vida, lamentavelmente até hoje mal administrados pela Caixa Econômica Federal.
Em seguida, passados quatro anos de uma Tsunami que destruiu as finanças da prefeitura, a ponto de ter calote no piso do magistério e salários de servidores atrasados, o povo nos trouxe de volta à condição de Prefeito porque afirmávamos que São Gabriel tinha jeito. E teve. Iniciamos o Programa Mais Exames e também o Programa Mais Infra, maior investimento urbano da história de São Gabriel, que ainda hoje semeia asfalto, calçamento e qualidade de vida nos nossos bairros e vilas. O desafio histórico da pandemia nos colocou diante de um falso dilema proposto pela mídia: defender a vida ou a economia? Nós, que sempre entendemos que os dois eram importantes, com o devido equilíbrio, de um lado estimulamos a vacinação e os cuidados sanitários, e do outro, fizemos o máximo possível e enfrentamos interesses poderosos para manter o funcionamento do comércio. Graças a isso, a perda de empregos na nossa terra foi bem menor do que em outros municípios gaúchos, e até algum ganho tivemos.
O reconhecimento do povo gabrielense diante da nossa luta nesse desafio nos deu nosso quinto mandato, e não poderia ser mais grato ao carinho e confiança da nossa gente. Não há outro político gaúcho que tantas vezes tenha recebido, pelo voto democrático e popular, o mandato do seu povo para governar o município, e por isso mesmo, a experiência nos dá uma percepção aguçada dos reais desafios que enfrentamos.
Para os críticos que sempre olham para o copo meio vazio, podemos hoje olhar pra trás e ver o quanto avançamos na geração de emprego e renda para nossa gente, desde a primeira gestão. Saímos de um PIB de R$ 285 milhões em 1997 para R$ 1,8 BILHÃO. O advento da citricultura, do florestamento, da soja, trouxeram atrás de si dezenas de beneficiadoras, somando centenas de empregos para os pais e mães de famílias da nossa gente.
Após cinco vitórias como prefeito e sete vitórias eleitorais em toda a vida pública, toda essa vivência nos faz identificar o grande calcanhar de Aquiles do nosso desenvolvimento. O descaso dos poderes públicos para a região é reflexo direto da nossa deficiente representação parlamentar na Câmara Federal. Como prefeito, vi diversas vezes as reuniões da bancada gaúcha em Brasília para definir emendas de bancada, onde o que manda é a influência de quem está no parlamento. No ano de 2017, uma emenda de R$ 70 milhões da Codepampa para patrulha agrícola para 15 municípios da Fronteira Oeste foi preterida em favor de R$ 80 milhões para uma ponte em Porto Xavier, que nem projeto tinha, porque era a base eleitoral do então líder do governo. Quem tem representação, garante os investimentos.
Estou convicto que a destinação de recursos maciços para o nosso desenvolvimento regional passa necessariamente por Brasília. Mais uma vez, o cálculo político e a prudência aconselhavam permanecer na função, colhendo os frutos de obras e investimentos que estão assegurados para os próximos três anos de mandato. Mas a Fronteira precisa de pessoas dispostas a ser a solução para esse desafio, e com muita humildade, mas também com experiência e energia, resolvo aceitar o desafio a mim imposto, primeiramente pelo meu amigo e irmão Giovani Cherini, e em seguida pelo seu sucessor na presidência do Partido Liberal, Onyx Lorenzoni, ministro do presidente Jair Bolsonaro.
É por essa razão que hoje, cumprindo a exigência legal que obriga os gestores executivos ao afastamento definitivo da função seis meses antes das eleições, renuncio ao mandato de Prefeito Municipal, e respeitosamente coloco meu nome à disposição do Diretório do Partido Liberal para disputar uma vaga na Câmara Federal.
Essa não foi uma decisão fácil. Foi cercada de muita conversa com amigos, com a minha família, com companheiros de luta, e com eles compreendemos que este passo não é um afastamento do projeto que a comunidade elegeu nas urnas, mas sim uma nova etapa. Para consolidar o nosso desenvolvimento, é preciso buscar os recursos onde eles estão, ter uma voz ativa comprometida com São Gabriel, com os municípios, com a economia da nossa região Centro-Oeste. Não estamos deixando de lado o pacto assumido com os gabrielenses. Ao contrário, estamos aprofundando esse compromisso, dando um novo passo para que nossa terra tenha o tratamento que merece dos nossos governantes.
Não seria possível tomar esta decisão sem a certeza que nossa terra estará em excelentes mãos. Ao povo gabrielense posso garantir, podem confiar em Lucas, em breve prefeito dessa terra, meu valoroso companheiro de chapa e de governo, um jovem estudioso, alinhado com as mais modernas práticas de gestão que existem no mundo, e que não exerce a função de forma decorativa. Ao contrário, trabalha diariamente na prefeitura, dá valor ao trabalho de cada colaborador, foi importantíssimo em diversas decisões de governo que tomamos em conjunto. A renovação política que muitos gabrielenses pediam, aí está. Mas uma renovação segura, sem rupturas, feita de forma serena, com a continuidade das nossas conquistas.
Ao longo de todos estes anos de vida pública, sei perfeitamente o quanto minha missão cobrou de sacrifícios, especialmente para a minha família. Eles sempre sofreram comigo quando me expus, quando eventualmente fui atacado ou agredido injustamente. Mas também posso dizer o quanto minha família sempre sentiu, junto comigo, o carinho, o amor e o acolhimento dessa gente querida, fortalecendo ainda mais nosso amor e nosso compromisso uns com os outros, e com a nossa terra.
Fica minha eterna gratidão ao povo da minha querida terra, que tantas vezes me conduziu ao comando do Executivo; à Câmara de Vereadores, cujos parlamentares nunca faltaram à aprovação de projetos efetivamente voltados ao bem comum da nossa terra, fossem da situação ou da oposição. Sobretudo, uma palavra de agradecimento às instituições da nossa sociedade civil, nossa Guarnição Federal, Associação Comercial e Industrial, Sindicato Rural, Câmara dos Dirigentes Lojistas, sindicatos de trabalhadores, entidades assistenciais, a nossa Santa Casa. Sem esse respaldo, muitas ações em prol da nossa gente simplesmente não teriam acontecido.
Eu não tenho dúvida de que, neste dia como em outros da nossa caminhada, estamos fazendo História. Cada mandato, cada conquista, cada benefício entregue para a comunidade, teve o apoio incansável de muitos bons companheiros que, décadas atrás, sonharam comigo essa possibilidade. Eglon Corrêa, Paulo Forgiarini, Ângela Scipioni, Reuso Vasconcelos, Adriane Langmantel, meu querido pai José Gonçalves. Em nome deles, que nos ajudaram a semear o nosso legado, e também olhando para o futuro, damos esse novo passo. A decisão, será do povo de São Gabriel e da Metade Sul do Estado.
Renuncio hoje, não por covardia ou pelo peso do cargo. Renuncio à posição em que hoje sirvo ao povo de São Gabriel, na esperança de continuar servindo, com a mesma devoção e entusiasmo, ao desenvolvimento do nosso Município e região. Espero ser levado ao Coração desse País, para lutar com a mesma garra de sempre pelo futuro de nossa gente.
Muito obrigado!
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